Está em tramitação no Congresso o Projeto de Lei 2.630/20, que visa combater a disseminação de notícias falsas em redes sociais. Porém, para Ronaldo Lemos, advogado e diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, o projeto traz alguns aspectos que são preocupantes e discriminatórios, podendo ter o efeito reverso de aumentar a desinformação, ao invés de diminuí-la.
Em sua coluna no jornal Folha de S.Paulo, o especialista apontou como exemplo o fato de o projeto criar um tipo de cidadão no Brasil que pode ser imunizado contra qualquer tipo de moderação de conteúdo, políticas ou termos de uso das plataformas. Isso acontece por meio de um parágrafo que determina que “a imunidade parlamentar estende-se às redes sociais”.
“Essa mera formulação causa arrepios. Ela pode ser aplicada como carta-branca para que parlamentares possam dizer e fazer o que bem entenderem nas redes sociais, sem sofrerem qualquer tipo de moderação”, ressaltou.
Ronaldo Lemos destacou duas razões pelas quais essa disposição é problemática. Primeiro, porque a liberdade de expressão não é um direito absoluto e diversos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário tratam das restrições à liberdade de expressão.
O outro problema de estender a imunidade parlamentar para as redes sociais é que estas são entidades privadas. Segundo o advogado, qualquer tipo de imunidade só é oponível com relação ao Estado e a agentes públicos.
“Não faz sentido haver imunidade com relação à atuação de entidades privadas. A figura da imunidade parlamentar — que é importante — tem por objetivo preservar o exercício do mandato contra a interferência de outros agentes públicos, integrantes do corpo político do Estado. Não contra a sociedade”, reforçou.
Ainda de acordo com Lemos, deturpar o conceito de imunidade dessa forma, usando-o erroneamente contra entidades privadas interfere na esfera de direitos e autonomia da sociedade, violando a constituição.
“Não é admissível que exista uma classe de cidadãos com esse tipo de ‘superpoder’ livres para fazerem o que quiserem nas redes sociais, sem poderem ser incomodados e moderados, mesmo quando incitem a violência, violem a lei e tratados internacionais. Em outras palavras, o projeto de lei das fake news institucionaliza o fenômeno da carteirada”, concluiu.
O presidente do Google Brasil, Fabio Coelho, também fez algumas críticas ao projeto. Segundo ele, o texto pode acabar promovendo mais notícias falsas no Brasil, e não menos. Além disso, resultaria em uma péssima experiência para os brasileiros buscando informações em mecanismos de pesquisa na internet.
Inclusive, o Google lançou no último sábado (2/4) uma campanha publicitária contra o projeto, alegando que o texto pode obrigá-lo a financiar notícias falsas. A empresa também publicou anúncios pagos em páginas inteiras dos principais veículos impressos do Brasil: O Globo, Folha de S.Paulo, Estado de S. Paulo, Correio Braziliense. Por outro lado, veículo da grande mídia já demonstraram apoio ao PL 2.630/20.