Segundo o ministro, a democracia não é um regime político de consenso, mas um regime em que a divergência é absorvida de maneira institucional e civilizada
“Acho que estamos, aos poucos, reconstruindo um país em que não há sérios riscos à democracia, em que as pessoas voltam a conversar”, disse, citando como exemplo o diálogo entre o ministro da Justiça, Flávio Dino, e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que participaram, civilizadamente, de uma mesa de debate no Fórum, tendo como tema a preservação do Estado Democrático de Direito. “Pode parecer pouca coisa, mas isso é uma mudança profunda e reforça o que o país viveu nos últimos quatro anos”, assinalou.
Segundo Barroso, a democracia não é um regime político de consenso, mas um regime em que a divergência é absorvida de maneira institucional e civilizada. “Aqueles tempos de ofensas, de agressões em que vivemos devem ficar apenas nos registros como um mau momento brasileiro”, frisou. Questionado se o Brasil aprendeu a lição, ele afirmou que o país já tinha feito a lição de casa, especialmente no que se refere à politização das Forças Armadas. “Essa politização não faz bem para a democracia, para o país e tampouco para as Forças “, assinalou. “Infelizmente, nós vivemos um período em que essa lição foi esquecida. Mas acho que ela foi recuperada.”
Segundo o ministro, os ânimos em torno das Forças Armadas se acalmaram, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltando a conversar tranquilamente com os chefes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. “Justiça seja feita ao ministro da Defesa, José Múcio Monteiro. Passou aquele período que deve ser lembrado como um tropeço”, afirmou. “Agora, estamos de volta aos rumos desejados, que são aqueles em que as Forças Armadas são importantes como instrumentos para a defesa nacional, inclusive na área de educação. O único lugar que não é bom para as Forças Armadas é a política.”
Proteção da Amazônia
No entender de Barroso, um lugar que o Brasil precisa que as Forças Armadas atuem de forma eficiente é na proteção da Amazônia. “O Brasil vive a sua ‘guerra particular’. Não é contra outro Estado soberano, é uma guerra contra o crime organizado. Eu sei que as Forças Armadas não exercem diretamente um papel na segurança pública, mas, na Amazônia, sem a logística das Forças, não há como ter enfrentamento. Ali, temos a mineração ilegal, a extração irregular de madeira, o tráfico de drogas, que ou estão associados entre si ou associados com organizações criminosas. Isso nós precisamos enfrentar com urgência, no mínimo, com o apoio logístico das Forças Armadas.”
Barroso chamou a atenção ainda para a importância da regulação das redes sociais. Mas, segundo ele, trata-se de uma questão que exige a participação de muitos atores. “Envolve a participação do governo, criando um arcabouço legislativo, envolve a autorregulação pela plataformas digitais e envolve a sociedade civil no seu processo midiático “, explicou. Neste caso, a educação significa não repassar informações cuja autenticidade não se tenha certeza.
“Pode parecer romântico eu falar de educação midiática, mas, na minha primeira juventude, e estou na terceira, havia campanhas para as pessoas não jogarem lixo nas ruas, nas estradas. As pessoas precisavam ser educadas para não ter aquele comportamento. Creio que é a mesma coisa que teremos de fazer em relação à desinformação”, ressaltou o ministro. Para ele, muitas pessoas que repassam fake news são inocentes, ingênuas. Mas existem os maliciosos, as milícias digitais. “Boa parte do problema é feita por ingenuidade e ignorância. Então, teremos de passar por um processo de educação da sociedade.”
Ele destacou acreditar mais na educação no que na repressão, ainda que, nos casos de comportamentos constantes de violação das normas mínimas de convivência, medidas coercitivas tenham seu valor. “Temos de educar as pessoas e convencer as plataformas digitais de que, se elas se transformarem em instrumentos destrutivos da democracia ou violadoras semana direitos fundamentais, vão perder prestígio e vão se esvaziar”, disse. “Portanto, esse é um projeto coletivo, não de uns contra os outros.”
Fonte: CorreioBraziliense